É raro, mas casos emblemáticos de relação custo-benefício podem vir de
onde menos se espera. Geralmente atrelado a etiquetas de preços
exorbitantes, o segmento de esportivos pode produzir pechinchas. Os 406
cavalos do Chevrolet Camaro, por exemplo, são o máximo que R$ 203 mil
podem comprar – geralmente, essa quantia dá direito à metade de
potência. Já quem pensa num Citroën DS 3 de cara desconfia que o hatch
francês abre mão de alguns equipamentos elementares – direção
hidráulica, bancos traseiros ou quem sabe o estepe – para custar bem
menos que Audi A1 Sport e Mini Cooper S. Mas não: seus R$ 79,9 mil
entregam os mesmos níveis de diversão ao volante, luxo e conforto que os
rivais, que partem de R$ 109,9 mil e R$ 128,7 mil. E o melhor é que o
“fenômeno” não é exclusivo dos importados.
Basta lembrar do Fiat
Punto T-Jet. A versão esportiva do hatch foi lançada em 2009, um ano e
meio após a chegada do Punto ao mercado nacional, por R$ 59,5 mil. Em
meados de 2012, passou pela primeira renovação, que lhe deu novo visual e
o inédito DNA. Em resumo, ficou mais bonito e equipado. Deveria ter
encarecido, mas ficou mais barato: R$ 56.820.Não é preciso dizer que ver o T-Jet na rua é evento raro. Completo,
chega a salgados R$ 68.229, preço de hatch médio. E o tal hatch médio
até pode acompanhar o T-Jet com ar-condicionado digital, sistema de
navegação (o do Punto
é bem simplório, aliás), comandos do rádio no volante, sensores de
chuva e crepuscular, mas dificilmente terá airbags laterais e de cortina
e teto solar panorâmico. E, menos ainda, o carisma desta versão, que
invariavelmente cola no seu dono a imagem de consumidor que gosta de
dirigir e compra seu carro sem qualquer amarra mercadológica.
A caracterização do novo Punto está mais coerente com a proposta
esportiva: saem as caixas de roda – dignas de um modelo Adventure – e
assumem a decoração para-choques com um belo (mas inútil) corte nas
laterais. Na traseira, um igualmente atraente e inócuo defletor carrega
as luzes de ré, enquanto as lanternas agora trazem LEDs. As rodas também
têm estilo mais agradável e a lateral ganhou uma faixa decorativa –
obviedade entre os automóveis esportivos, mas que nesse caso é de bom
gosto.O Punto T-Jet continua a oferecer mais por menos na cabine.
O painel de
instrumentos, que já não era dos piores, ganhou velocímetro e
conta-giros iguais aos dos carros da Alfa-Romeo – comparação que,
considerando a aura de esportividade e estilo das quais a marca italiana
goza, significa mérito. O volante ganhou apliques em alumínio e
melhorou a já boa pegada, graças à troca do revestimento da peça, e os
bancos reúnem acabamento, conforto e solidez ímpares na categoria.O resultado visual e os elementos internos que diferenciam a versão
T-Jet instigam o motorista antes mesmo de a 1ª marcha ser engatada.
A coroação do Punto T-Jet como esportivo amigável, prático e usável
no dia-a-dia é o DNA, recurso que basicamente muda a sensibilidade do
acelerador conforme o humor do motorista. No “A”, de autonomia, a
resposta é retardada e o condutor passa a visualizar no painel, além de
um econômetro, um indicador de troca de marcha, que sugerem um trato
mais dócil com o acelerador. Em “N” (normal), o carro apresenta
comportamento supostamente igual ao T-Jet anterior.Já no “D”, de dinâmico, há uma relação mais direta com a borboleta,
deixando o carro mais divertido e arisco. Mas não tão arisco quanto o
botão OVB deixa o "irmão" maior Bravo
T-Jet. O princípio é o mesmo: alterar opcionalmente o comportamento do
carro. A diferença é que no Bravo o botão Overbooster eleva a pressão do
turbo (que vai para 1 bar) e incrementa o torque para 23 kgfm, ante os
21,1 kgfm “originais”.A intenção é boa, mas o resultado, ruim. A reação do acelerador é tão
arisca que torna o Bravo T-Jet, originalmente um carro prazeroso de
guiar, um automóvel cansativo, chato de ser domado. Portanto, se errou
na dose com o Bravo, a Fiat se redimiu com o Punto, que sabe divertir
sem irritar quando seu DNA está no D.No entanto, dois erros da antiga versão foram transferidos para o
novo T-Jet. Não ter a 6ª marcha (como o Bravo T-Jet, equipado com o
mesmo motor, tem) impede o Punto de ser tão bom na estrada quanto é num
autódromo (ou num uso urbano mais atrevido). A 120 km/h sobra força ao
motor, mas a rotação orbita em sonoros 3.500 rpm. Ainda assim, o consumo
foi bom para um esportivo: 11,5 km/l de média.Outra chance perdida pela Fiat foi a de deixar o câmbio do hatch mais
preciso e com engates mais firmes. Recorrente a todas as versões desde
seu lançamento, tal crítica foi ignorada. A excelente posição da
alavanca em relação ao motorista compensa, em parte, o comportamento
indigno de um esportivo.Mas, no fim das contas, é pouco perto do que o Punto T-Jet oferece e,
transferindo sua análise para a esfera moral, o que ele representa: a
sobrevivência de esportivos nacionais e, sobretudo, acessíveis.
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